sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Desenho Fora do Papel: Robin Rhode


Chalk Bike (Bicicleta de Giz), 2015. Giz e bicicleta de aço. Cortesia do artista e da Lehmann Maupin Nova Iorque e Hong Kong.
A evolução da técnica gráfica entranhou-se na condição cultural do Homem de um tal modo que, com o tempo, a maior parte das pessoas adquire a noção de que a um desenho está sempre associado um suporte tradicional como seja o papel, o tecido ou mesmo a pele - humana (tatuagens, por exemplo) ou de outro animal (pergaminho e velino medievais quando ainda não se conhecia, no ocidente, a tecnologia do papel). Lembremo-nos ainda do desenho técnico – ou da técnica do desenho – usada por carpinteiros ou pedreiros ao fazerem marcas e linhas (elementos primordiais do desenho) sobre pedra ou madeira para depois trabalhar sobre eles. Tendo isto em linha de conta o quão estranho será, por isso, desenhar fora do papel? Será que o ato de desenhar fora do papel retira propriedade ao conceito de desenho? Certamente que não. Fazer marcas com um material riscador é a essência elementar do desenho e se não como arte então pelo menos como apoio ao raciocínio ou ao pensamento criativo. Esta introdução genérica acerca da alteridade do desenho serve apenas para enquadrar a dimensão epistémica de como certos artistas contemporâneos reconstroem numa forma atual a noção do desenho fora do papel.
Robin Rhode nasceu na Cidade do Cabo, África do Sul, em 1976, foi criado em Joanesburgo e, graduou-se na South Africa School of Film, Televison and Dramatic Arts (Joanesburgo) em 2000. Apesar de ter crescido na época pós-apartheid, este artista foi mais influenciado pelas novas correntes artísticas de expressão individual do que propriamente pelo desenrolar de efervescentes questões sociopolíticas. No seu trabalho, Robin Rhode abarca vários media visuais como a fotografia, a performance, a escultura e o desenho para criar narrativas com mais ou com menos pendor para a crítica socioeconómica. A sua preocupação parece ser, isso sim e acima de tudo, a narrativa da expressão do indivíduo.
A maior parte dos seus trabalhos mostra uma sequência gestual – para a qual um observador mais avisado poderia lembrar-se de “Sequentially Yours”, de Eliot Erwitt – que implica performance e à qual é inerente a componente tempo. A performance não existe sem a componente tempo e ainda menos sem a componente espaço, entrando esta última em linha de conta através das representações gráficas que constroem o alicerce da sequência. Nas imagens bidimensionais que Robin Rhode cria, as duas componentes – tempo e espaço – são colapsadas pelo imaginário do observador e remetem para a sequência do gesto mesmo quando esta sequência não é explícita, mas antes se deixa apenas deduzir (Chalk Bike, ver abaixo). O gesto, por seu turno, é todo aquele com o qual o observador se identifica, e que lhe é, de alguma forma, familiar. A mão que aciona um gira-discos de giz (Wheel of Steel) ou o pescador de cana de pesca na mão a lutar com um pisciforme grupo de triângulos (School of Fish) são imagens que numa primeira aproximação se revelam como fotográficas, como se fossem fragmentos de uma animação mais completa, mas que na verdade assentam numa outra forma basilar sem perderem a condição dinâmica do movimento gestual latente: o desenho. O observador identifica-se facilmente com estes movimentos. Na imagética de Robin Rhode o desenho assume a dimensão que lhe é própria: transmitir uma ideia, uma noção, através de um mínimo de elementos que permitam ao interlocutor identificar o objeto patente na representação. O conhecimento a par com a experiência do observador constrói o resto da narrativa segundo as instruções que a obra do artista lhe fornece através das linguagens complementares (performance, escultura, etc.) que compõem o global da obra, quer seja no transporte para a memória, no transporte para outra experiência vivida ou para um qualquer aspeto do quotidiano - embora aqui a atividade do quotidiano para a qual é remetida seja usada como ponte para outro significado mais transcendente como as relações da matemática ou da lógica (Pascal’s Iron) e da “dança dos números” naquelas disciplinas (Typing Steps).

A obra (Bent Mies) é paradigmática no que toca à elementaridade do desenho: um indivíduo parece puxar pela linha que constitui uma cadeira cujo design é da autoria de Mies Van Der Rohe (alusão dupla à condição do desenho), mas ao invés de a cadeira se ir desfazendo como acontece quando se puxa a linha de uma camisola de lã aqui o objeto/cadeira vai-se multiplicando cada vez mais enquanto a linha se materializa num tubo (matéria prima da cadeira desenhada por Mies Van Der Rohe), num jogo absolutamente delicioso que questiona, enfim, o que se entende por desenho.
Robin Rhode é, por isso, exímio em usar o conceito de desenho na sua forma extra-ordinária, não se detendo apenas e definitivamente na estética street art convencional.


Robin Rhode vive e trabalha em Berlim e o seu trabalho é parte integrante de várias coleções públicas, incluindo Castello di Rivoli (Turim), Centre Pompidou (Paris), The Hirshhorn Museum and Sculpture Garden (Washington, D.C.), Miami Art Museum (Florida), Musée d'Art Moderne de la Ville de Paris (França), The Museum of Modern Art (Nova Iorque), Solomon R. Guggenheim Museum (Nova Iorque) e o Walker Art Center (Minneapolis).

Robin Rhode está representado pela Lehmann Maupin e poderá ver uma seleção dos seus trabalhos aqui.

Pormenor de Chalk Bike (Bicicleta de Giz), 2015. Giz e bicicleta de aço. Cortesia do artista e da Lehmann Maupin Nova Iorque e Hong Kong.

Evidence, 2015. Vinil, carvão e arame farpado. Cortesia do artista e da Lehmann Maupin Nova Iorque e Hong Kong.

Light Giver, Light Taker, 2015. Lâmpada preta: espuma de poliuretano e carvão; lâmpada branca: espuma de poliuretano e giz. Cortesia do artista e da Lehmann Maupin Nova Iorque e Hong Kong.

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